
Na metade dos anos 1980, o Titãs era meio que uma curiosidade da paisagem rock brasileira. Oito integrantes, vários vocalistas, sensibilidades diferentes colidindo o tempo todo. O grupo teve sucesso, porém era conhecido quase tanto pelas desventuras quanto pela música.
Especificamente em 1985, eles estavam em uma encruzilhada. O álbum Televisão, lançado em junho daquele ano, ficou aquém das expectativas criativas dos integrantes e comerciais da gravadora. Em novembro, o vocalista Arnaldo Antunes e o guitarrista Tony Bellotto foram presos por porte de heroína — um dos casos mais infames da época.
Artisticamente, os integrantes tinham gostos que puxavam para direções diferentes. Sons mais pesados e influências de punk, funk e reggae pareciam despertar maior interesse do que o pop tradicional. Fora a abordagem mais primitivista na hora de escrever letras.
Seja pela música “Cabeça Dinossauro”, composta de brincadeira no ônibus de turnê da banda em cima de um ritmo tribal Xingu, ou faixas como “Bichos Escrotos” e “AA UU”, as composições do período apontavam para uma vontade de expressar suas frustrações de jeito universal. Nada intelectual, só visceral.
Quando queriam falar de algo um pouco mais concreto, a mensagem ainda era bem simples. Nando Reis esbravejou contra a religião organizada em “Igreja” e a família tradicional na faixa “Família”. Tony Bellotto destilou a experiência de sua prisão e a raiva contra as autoridades na canção “Polícia”, enquanto Charles Gavin ofereceu seu ponto de vista sobre a mesma situação na letra de “Estado Violência”.
Todo esse material também se direcionava para um novo momento no Brasil. A política de censura prévia aplicada pelo governo federal desde 1964 diminuiu drasticamente desde a saída dos militares do poder em 1985.
Estrelas da música estavam testando, aos poucos, os limites das novas autoridades. Já o Titãs simplesmente chutou o balde.
“Bichos Escrotos” foi composta em 1982 e tinha uma letra cheia de palavrões, por isso não era permitida ser gravada pela censura. Agora que militares não estavam mais no poder, a banda aproveitou a deixa. Devido ao linguajar, a canção continuou proibida de tocar no rádio, mas a demanda de ouvintes era tamanha a ponto das emissoras decidirem arcar com as multas em troca da audiência.
Isso em si ilustra o poder de Cabeça Dinossauro (1986). A instrumentação era hostil e as letras abraçavam posições polêmicas na sociedade brasileira, mas algo era indiscutível: soava extremamente pop. Uma sensibilidade compartilhada por todos os integrantes do Titãs era a capacidade de criar uma melodia grudenta. Não à toa, composições desse disco ganharam versões por nomes que vão de Sepultura a Molejo.
Era o primeiro passo de um período de extremo sucesso para o Titãs. A tensão entre pop e experimental sempre se mostrou fundamental ao sucesso criativo deles. Quatro décadas depois, o público ainda enche arenas e estádios para ouvir essas canções — como o fará em 2026, na turnê que celebra o aniversário do disco.
Informações: Rolling Stone


